Bem no início da década de 1980 eu e minha família, que éramos gaúchos residindo em Curitiba, ficamos sabendo de uma novidade – havia em Porto Alegre um novo supermercado, imenso, como nunca havia se visto, chamado Carrefour.
E logo arrumamos um motivo para fazer a viagem a Porto Alegre, provavelmente a visita a algum parente, mas o objetivo real da viagem, inconsciente, era conhecer o Carrefour.
As pessoas que hoje já estão acostumadas a conviver com hipermercados não conseguem imaginar o choque que tivemos ao chegar ao Carrefour. Era do tamanho de um shopping Center (que até então também não conhecíamos), gigantesco. Entramos para conhecer, como turistas num parque. A primeira coisa que me chamou a atenção foi o espaçamento entre os corredores – havia muito espaço para os carrinhos de compra.
Uma vez dentro, deslumbrados com aquele paraíso do consumo, correu cada uma para um lado. Eu, corri para o lado dos brinquedos. Havia muitas repartições destinadas a brinquedos. Lá chegando, me deparei com uma coisa diferente – caixas da Gulliver contendo figuras de soldados e índios, com nomes como 7ª Cavalaria, Touro Sentado, Acampamento Apache, A Corrida do Ouro. As ilustrações das caixas eram bonitas, as novidades prometiam, o que será que havia dentro.
Imediatamente fiz minha mãe comprar uma ou duas, e corri para o carro (a esta altura já não estava mais muito interessado no Carrefour). Ao abrir as caixas que tanto prometiam, uma certa decepção – as figuras não eram pintadas, eram na cor do plástico.
Mas eram figuras interessantes, novas, todas em poses diferentes das figuras até então fabricadas. Gostei, e logo tinha todos os conjuntos.
Minha cabeça de criança demorou a perceber que estas novas figuras tinham vindo para substituir as figuras tradicionais com as quais eu brincava desde muito pequeno. Mas logo a coisa foi ficando clara – já não encontrava nas lojas as figuras tradicionais. Só as novas figuras, que agora também “povoavam” o novo Forte Apache lançado pela Gulliver.
Ao perceber isto adquiri uma implicância em relação a estas figuras, implicância esta que até hoje, quase quarentão, ainda paira pelo meu inconsciente.
Com o passar dos anos fiquei sabendo que as tais figuras eram criações da fábrica Italiana Atlantic, com a qual a Gulliver deve ter celebrado um contrato no final dos anos 1970 para produzi-las no Brasil. Como não temos acesso a informações da própria Gulliver, não podemos saber como foi o processo de escolha das figuras que iriam substituir as tradicionais até então produzidas, assim como não podemos saber quais razões levaram à escolha pelas figuras Atlantic.
O que sei é que a Gulliver apostou muito nessas novas figuras, tanto que lançou uma campanha de televisão (algo raro) para promovê-las. Na campanha apareciam as figuras da Atlantic em poses de batalha ao som de tiros.
Também sei que a produção da Atlantic foi muito maior do que as figuras que a Gulliver trouxe para o Brasil. Superando a implicância que adquiri pelas figuras Atlantic (pejorativamente apelidadas de “cabeçudos”), tenho que reconhecer que eles produziram algumas coisas interessantes e que, infelizmente, as figuras que foram trazidas para o Brasil, e que são as mesmas comercializadas até hoje (longos 28 anos), não representam o que de melhor a Atlantic criou.
A Atlantic era uma fábrica Italiana fundada em 1966, e que encerrou atividades em 1984. Produziu com sucesso figuras de variados gêneros nas escalas 1/32 e HO. Em seus últimos anos de vida, numa tentativa de sobreviver, lançou séries relacionadas à ficção científica.
Uma coisa que marcava a produção da Atlantic era conjugar mais de uma figura numa mesma figura – por exemplo – um homem segurando duas mulas, todos na mesma figura.
A Atlantic teve momentos brilhantes com, por exemplo, a figura do soldado fazendo pães no forno no acampamento da cavalaria.
Há um site internacional sobre a Atlantic sendo construído: http://www.atlantictoysoldiers.com. Portanto, aqueles que quiserem aprofundar informações sobre esta fábrica, podem a ele se referenciar.
A Atlantic produziu diversos conjuntos de figuras do velho oeste. Alguns:
- General Custer;
- A Corrida do Ouro;
- Acampamento Apache;
- Acampamento Sioux;
- Kit Carson;
- Búfalo Bill;
- 7ª Cavalaria;
- Acampamento da cavalaria;
- Davy Crockett;
Entre outros.
As figuras vinham em caixas, atrativas. Na frente da caixa havia a ilustração principal, e no verso algumas informações históricas (nem sempre com acuracidade científica).
Vamos a algumas imagens:
Além das caixas com figuras a Atlantic produziu, também, conjuntos. Encontrei na internet referência a três conjuntos:
- Wigwams (o acampamento dos índios);
- Apache Pass (o local da batalha);
- Fort Bowie.
Três curiosidades:
- O conjunto Wigwams lembra demais o conjunto Os Apaches produzido pela Gulliver em 1973 e 1974. Será que a aproximação entre as fábricas vinha de antes?
- A maior parte das figuras Atlantic comercializadas foi sem pintura, na cor do plástico, mas nas imagens desses conjuntos elas aparecem pintadas. De fato a Atlantic comercializou algumas figuras pintadas, e são muito raras;
- Os três conjuntos podiam ser unidos para formar um único set, como pode ser visto na imagem a seguir.
A informação que colhi na internet diz que a quase totalidade dos moldes Atlantic 1/32 estão no Iraque (não sei o que estão fazendo lá) e, consequentemente, não há perspectiva de relançamento. Quanto aos moldes 1/72 a maioria continua na Itália e alguns anos atrás foram cedidos para a empresa Nexus, que relançou as figuras da Atlantic nesta escala (pode ser encontrado na internet). Seguem as imagens da Nexus/Atlantic.
Gostou? Então, ao Ebay, pois há muita coisa da Atlantic em leilão por lá.
Até a próxima,
Marcos Guazzelli
Setembro de 2008.
(artigo escrito sob inspiração do colecionador Cassiano Olegário).